Crítica | A Máfia dos Tigres

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NENHUMA SINOPSE É CAPAZ DE PREPARAR O ESPECTADOR PRO QUE É ENTREGUE EM TELA APÓS VOCÊ “DAR PLAY” NO PRIMEIRO EPISÓDIO.

A nova minissérie documental da Netflix promete trazer ao longo de seus 7 episódios (uma quantia modesta, considerando que a média de tempo dos episódios é de 45 minutos) a história de Joe Exotic, um dono de zoológico nos Estados Unidos possuidor de uma das maiores coleções de grandes felinos do mundo, que perde o controle durante a administração e acaba sendo acusado de encomendar um assassinato. O que a sinopse não diz é que absolutamente nenhum personagem na trama é inocente (exceto pelos animais) e que, acima de qualquer coisa, o jogo de poder fala mais alto que tudo.

Pra fins de referência sobre as pessoas retratadas no filme, podemos encontrar dois que, caso cruzassem nosso caminho na rua, seriam considerados “normais”. Um deles é Joshua Dial, gerente de uma loja de armas e munições que posteriormente foi o gerente de campanha de Joe Exotic quando esse, em 2016 e 2018, concorreu como independente a presidência dos Estados Unidos (sim) e ao cargo de governador do Oklahoma, respectivamente. O outro, Mario Trabaue, um poderoso traficante durante os anos 80 que, dizem, serviu de inspiração para o personagem Tony Montana em Scarface (1983).

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Nosso protagonista, Joe Exotic, nascido Joseph Allen Schreibvogel, vem do Kansas msa se mudou com sua família para o Texas quando ainda pequeno. Joe se assumiu gay aos seus pais no final de sua adolescência mas após não conseguir a aceitação de seu pai tentou se suicidar jogando seu carro de uma ponte, mas acabou sobrevivendo. Após isso se mudou para longe de sua família para tratar seus ferimentos e fazer tratamento psicológico, nesta época também começou a ser introduzido ao mundo dos animais selvagens, trabalhando em uma loja de animais. Quando seu irmão morreu em 1997, Joe deixou pra trás seu trabalho na loja e comprou um terreno onde resolveu que criaria um zoológico em homenagem ao seu irmão, o que resultou na criação do Garold Wayne Exotic Animal Memorial Park. Os primeiros animais do zoológico foram os que seu irmão, Garold, deixou, mas pouco tempo depois, no ano 2000, seus primeiros tigres foram adquiridos.

A questão é que ao entrar no mundo dos grandes felinos, Joe Exotic também entrou num mundo perigoso onde as regras do jogo são feitas por aqueles que tem mais dinheiro. Joe através de contatos ou “doações” (quando outros donos de animais não se viam mais como capazes de cuidar deles, chamavam Joe para levá-los ao seu zoológico) aumentou exponencialmente sua coleção e em poucos anos já contava com mais de 200 tigres, entre outros animais. Além disso, ele possuía um canal online onde exibia conteúdos ao vivo sobre seu zoológico e cruzava o pais levando filhotes de tigre para serem expostos em shoppings centers como forma de ganhar dinheiro com os animais. Era questão de tempo até que virasse alvo de organizações contra abusos de animais.

Em 2011, Carole Baskin, fundadora do santuário Big Cat Rescue, organizou uma inúmera série de protestos através do país para impedir que Joe Exotic continuasse lucrando com os animais. Nesse cenário temos o início do maior conflito da série, sendo comparado em alguns momentos a rixa entre Hatfields e McCoys. Joe não aceita e começa em seu site a fazer com que a maior parte de seus vídeos seja sobre o ódio mortal que possui em relação a Carole, expondo-a como alguém que também lucra com os animais e revivendo suspeitas de que ela teria assassinado seu ex-marido (fato este que é amplamente debatido no terceiro episódio da série e que resultou inclusive em um clipe musical onde Joe contratou uma sósia de Carole para fazer uma reprodução de como teria sido o assassinato).

Ao longo dos anos a intensidade dos conflitos só aumentou, com processos milionários acontecendo e culminando, finalmente, na contratação de um matador de aluguel para eliminar Carole da disputa. É somente nesse momento da série que a polícia interfere de maneira séria em toda a confusão. Uma série de medidas são tomadas para conseguir a prisão de Joe Exotic resultando na sua prisão em setembro de 2018. Um julgamento amplamente coberto pela mídia ocorre nos meses seguintes resultando na condenação de Joe, mas a validade das acusações e a justiça por trás de todo o caso são muito contestadas por uma grande parte dos envolvidos.

A questão que parece ser mais sensível é que, além do fato de obviamente, nenhuma das partes ser totalmente isenta, não existe qualquer forma de posicionamento por parte do governo norte-americano que proíba ou regularize o comércio e/ou criação dos grandes felinos e de outros animais selvagens, o que permite o crescimento gigante de um mercado ilegal, nocivo aos animais (os tigres são uma espécie que não está longe do risco de extinção e que, atualmente existem em maior número em cativeiros do que em seu habitat natural), altamente lucrativo para os que deles se beneficiam e que facilita o crescimento de um circo midiático que não leva a lugar algum.

Máfia dos Tigres, no final, é uma boa série com uma boa produção, mas que, no final, cai na sina de procurar expor muito mais o lado vendável dos humanos envolvidos do que o dos animais explorados. É uma minissérie que pode ser rapidamente maratonada com um ritmo fluído, só que ao acabar deixa a sensação de que nada mudou e, sem uma intervenção coerente, nada será mudado.

7,6

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