Crítica | Last Midnight Tea - nobandnobrand

“I just need a good memory of your presence
Like a farewell cigarette”


Lembro que, há poucos meses, havia uma discussão muito recorrente na internet sobre como críticas musicais deveriam ser escritas. Alguns defendiam a ideia de que o autor deveria ser o mais imparcial possível, se distanciando totalmente da obra e levando em consideração apenas pontos objetivos. A questão é: como se avalia arte, que por natureza é altamente subjetivo, apenas por pontos objetivos? Ou então, no meu caso neste momento, como avaliar arte objetivamente de alguém que você conhece?

Nos dois pontos que levantei acima, a resposta é simples: é impossível. Todos nós somos formados por experiências e conhecimentos passados, construídos por amigos, familiares, colegas, entre tantas outras pessoas que podem agregar em nossas vidas. Sempre levamos em consideração a nossa carga cultural quando avaliamos qualquer coisa, e com a música isso não seria diferente. Além disso, eu tive a oportunidade de conhecer pessoalmente quem está por trás de nobandnobrand, o que ao meu ver, é uma vantagem na hora de avaliar a sua obra. Explico: me incomoda profundamente como ouvinte quando preciso me perguntar o quão genuíno é aquilo que o criador está querendo passar através de sua música. Para mim, a arte pela arte é irrelevante pois ela perde o significado do que realmente deveria ser - um instrumento de expressão.

Como amigo de Bernardo, posso afirmar que “Last Midnight Tea” é um projeto autêntico, com a personalidade do artista imbuída em sua essência e que traz em si um elemento que falta na indústria musical: a verdade. nobandnobrand expressa legítima e verdadeiramente suas emoções, sejam elas positivas ou negativas. Altamente influenciado por gêneros como bedroom pop e pc music/hyperpop, as cinco músicas do EP são intimistas o suficiente para que pessoas que não os conheçam consigam se identificar também.

O projeto abre com o interlúdio “God Ex Machina”, onde, por meio de sua produção, a música consegue explicar a sua ideia mesmo para aqueles que não estejam familiarizados com o termo. Em palavras simples, o conceito de God Ex Machina se refere a uma solução rápida dos problemas, algo que simplesmente vem e... “puft!” - resolvido! Através do vocal cansado e do chamado de polícia ao fundo da canção, o sentimento de esgotamento e angústia estão presentes, resultando na inércia para solucionar as suas dificuldades e se fazendo necessário que um poder maior interfira.

Last Bonus Track”, a segunda faixa do EP, traz consigo um instrumental muito semelhante ao das famosas lovesongs dos anos 80. Se Phil Collins fosse produzido por Dayglow usando inspirações de Kanye West, o resultado deste trabalho certamente teria esta sonoridade - uma balada romântica repaginada, reimaginada e produzida para os dias atuais. Na questão lírica, somos introduzidos ao fim de uma história de amor, na qual a “Last Bonus Track”, ou a última faixa bônus, refere-se à última noite juntos do casal. Repleta de ternura, vemos que embora o relacionamento tenha terminado, ainda existe a vontade de manter boas memórias desse período.

Em contraponto, somos apresentados à “Apartment 4 Rent”, onde o sentimento desse affair passa de carinho para melancolia. Misturando inglês e português, essa alternância de línguas também pode ser entendida como a díade de emoções que nbnb sente sobre o término dessa relação - o vazio e o preenchimento, o amor e a saudade, a felicidade e o luto. Novamente, o título agrega valor à música (e à obra num geral). O apartamento que está para alugar, na verdade, é o coração vazio do artista que agora busca por um novo inquilino, ainda que o antigo morador não tenha entregado o imóvel em perfeito estado.

Se aventurando em uma mistura de trap e hyperpop, temos uma ideia do que seria uma união de Charli XCX com Drake em “Perfume Bokeh”. Por vezes, os vocais pecam na aliteração rítmica em seus versos, entretanto, entregam um refrão altamente catchy:

“Up all night the lights are going
Down on me while you’re here
Empty glasses full of feelings Soon to be RIP’d
Pull me closer, then go further
Than you ever, have
Eyes closed, perfume bokeh”

Enérgica e divertida de ouvir, somos mais uma vez apresentados a um novo recorte de relacionamento, talvez com outra pessoa, talvez com a mesma musa inspiradora das outras canções. Aqui, notamos que o desejo carnal e o jogo de interesses também fazem parte da persona nobandnobrand, embora não deixe de mostrar o cuidado, afeto e a carência de sua essência. Como diz o ditado: “um pouco de droga, um pouco de salada”.

Fechando as cinco músicas, temos o single “Memento”. Embalada por uma sonoridade mais etérea e pandêmica, vemos um pouco da angústia do artista em relação ao sentimento de incerteza, seja ele mostrado através de seus vínculos amorosos ou do estado que passamos durante a quarentena. O título, de novo, adiciona valor à obra ao fazer referência talvez não ao filme, mas ao conceito de Memento, quando memórias são ativadas através de objetos.

“In my right pocket, a memento for bad times”

ou

“In my right pocket, a memento for good times”

Ainda sobre a letra, a ansiedade e as inseguranças do futuro são retratadas e resolvidas quando ele canta no final:

“My life it’s back where it should be
And all those endless days and nights
In my right pocket, a memento for all times
I wear my jeans, walk on my own
Good to be back, the outside world”

Memento” não é a última música por acaso. Durante o EP somos apresentados a diversas angústias do artista, que antes pareciam não ter solução. Nesta faixa, a música discorre e evolui até o momento de redenção. Agora, ele não precisa mais olhar para o passado e reviver os sentimentos negativos, pois mostra que atingiu a resolução dos problemas anteriormente citados. nbnb está curado e pronto para seguir em frente, de braços abertos para o mundo.

“Last Midnight Tea” é um EP bem executado e coeso em seu conceito, que exala a personalidade e a musicalidade do projeto. Os cuidados e o preciosismo com a produção de cada música mostram uma necessidade artística de expressar fielmente aquilo que está sendo retratado na obra - para mim, um ponto muito positivo, como já explicado.

Mesmo adotando e absorvendo diversos gêneros e inspirações, a individualidade do músico é o que mais se destaca nos versos de cada canção. Sendo esse o seu primeiro trabalho publicado, nobandnobrand define sua estética com categoria e demonstra um grande potencial para o futuro. Com certeza deixaremos o rádio ligado para sintonizar no que está por vir.

8,5

Anterior
Anterior

Crítica | Não! Não Olhe!

Próximo
Próximo

Crítica | Taxi Driver